Aos 82 anos, Dori Caymmi move águas passadas em álbum em que alimenta a utopia de uma canção brasileira purista
Dori Caymmi lança o álbum 'Utopia' amanhã, 26 de agosto, dia em que festeja 82 anos de vida Isabela Espíndola / Divulgação ♫ OPINIÃO SOBRE DISCO Títul...
Dori Caymmi lança o álbum 'Utopia' amanhã, 26 de agosto, dia em que festeja 82 anos de vida Isabela Espíndola / Divulgação ♫ OPINIÃO SOBRE DISCO Título: Utopia Artista: Dori Caymmi Cotação: ★ ★ ★ 1/2 ♬ Dori Caymmi aparece com a fisionomia carrancuda, meio chorosa, na imagem exposta na capa de Utopia, álbum que lança amanhã, 26 de agosto, dia em que completa 82 anos de vida. Na capa do álbum Utopia, Dori aparece retratado aos três anos de idade em pintura feita em 1946 pelo pai do artista, um certo Dorival Caymmi (1914 – 2008). O ar carrancudo se afina com a fama de rabugento que acompanha Dori por toda a vida por conta do (mau) humor mordaz e por vezes risível quando defende com paixão as tradições da música brasileira. Em Utopia, disco editado pela gravadora Biscoito Fino com repertório autoral composto por nove músicas inéditas e pela regravação do frevo Ninho de vespa (1990), o cantor, compositor e violonista alimenta e defende o sonho de uma canção extremamente brasileira e purista, imune aos efeitos do tempo e das modas musicais. O advérbio “extremamente” é usado pelo artista no texto de apresentação do álbum. Poeta que defende a mesma utopia e a quem o álbum é dedicado, Paulo César Pinheiro é o letrista parceiro de Dori em sete das dez músicas, inclusive em Ninho de vespa, o já mencionado frevo lançado por Dori no álbum Brazilian serenata (1990) – com vocalizes e um toque de jazz – e ora revivido em passo mais tradicional com a letra em português dividida por Dori com o MPB4. Capa do álbum ‘Utopia’, de Dori Caymmi Pintura de Dorival Caymmi / 1946 Embora a safra inédita não se imponha no conjunto da obra densa de Dori, o álbum Utopia traz boas canções que parecem habitar algum lugar do passado da música brasileira. É o caso sobretudo de O nome da moça, parceria de Dori com Roberto Didio gravada com a adesão de Mônica Salmaso, cantora identificada com a estética de Dori a ponto de ter feito álbum com o artista, Canto sedutor (2022), lançado há três anos. O nome da moça começa como cantiga à moda antiga, com a voz de Salmaso, e evolui para samba-canção quando a voz de Dori entra já na segunda metade da faixa. Assim como o álbum anterior de Dori Caymmi, Prosa & papo, Utopia tem produção musical assinada pelo baixista Jorge Helder e flerta com certa leveza em faixas como a canção marítima Búzio azul (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro), gravada com o grupo Boca Livre. Canção estradeira de Dori com Paulo César Pinheiro, Viageiro junta as vozes dos quatro convidados do álbum – Boca Livre, Mônica Salmaso, MPB4 e Sérgio Santos (parceiro e intérprete da canção Pelas mãos de algum poeta) – em rota situada em algum ponto do Brasil rural, sinalizado pelo toque da sanfona de Lulinha Alencar. Ode ao isolamento existencial, a canção Sozinho de nascença (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro) exala certa melancolia – realçada pelos fraseados dos violoncelos de João Bustamante e Yuri Ranevski – enquanto Navegação (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro) faz a travessia intercontinental de além-mar entre Portugal e Angola, transitando com alta carga de poesia pela solidão e pelo inverno que não aquece a alma do tripulante. Primeira parceria de Dori com Ivan Lins, Isabela é perfilada em clima onírico afinado com o título do álbum Utopia. Dori divide com Ivan a interpretação da canção ancorada no recorrente mar de poesia que banha parte do repertório inédito do disco. Mesmo quando apresenta canções inéditas com Paulo César Pinheiro, como Filete d’água e Filigrana (joia adornada na gravação pelo sopro do clarinete de Cristiano Alves), Dori Caymmi move águas passadas com requinte ao alimentar a utopia de uma música “extremamente” brasileira. Dori Caymmi posa no estúdio da gravadora Biscoito Fino com o grupo Boca Livre, com quem canta as músicas 'Búzio azul' e 'Viageiro' no álbum Utopia Isabela Espíndola / Divulgação